sábado, 28 de setembro de 2013

Orpheu e Eurídice: Um romance desconstruído



O mito grego Orfeu e Eurídice conta a história de um casal apaixonado, mas que diante de um destino carregado e dor foram separados pela eternidade. Porém nossa análise consiste em desvelar o que há por trás do mito e o que ele realmente pretende nos demonstrar.

       Partiremos do momento em que Eurídice é mordida por uma serpente ao fugir de um homem e após isso ela morre e sua alma é levada ao reino dos mortos. Orfeu que até então era um homem feliz com suas poesias, arpa, músicas e cantos cai em profunda tristeza por perder sua amada. Orfeu que antes encantava a todos, de seres humanos a animais com sua música agora se isolava do convívio humano mergulha em profunda tristeza. Por fim, não conseguindo suportar mais aquela situação, resolve adentrar ao mundo dos mortos a fim de resgatar a sua amada.
         Até este ponto nada fica bastante claro, porém, para que a ordem lógica da análise siga um esquema comecemos a levantar nossas questões: Eurídice é separada de seu amor por uma serpente e após disso Orfeu cai em tristeza, mas resolve ir ao mundo das trevas a fim de resgatar sua amada. Nesse ponto pensemos: a serpente sempre nos foi associada a uma imagem de traição, como podemos ver na bíblia, após o surgimento dela é que os dois se separam. Orfeu á traíra, devastou a confiança de sua amada Eurídice que agora se afasta do mesmo o deixando só e desolado. Porém, este homem ao enfrentar o poderoso centro de sua consciência, o ego, percorre determinado o caminho escuro do mundo das trevas a fim de reaver sua amada.
        Ao adentrar ao do reino inferno, Orfeu faz ecoar o som de sua lira por todo o mundo das trevas. Os demônios e almas condenadas que lá residiam ficaram todos encantados com o som de sua lira e até mesmo o senhor das trevas, o deus Hades se encantou e dele lágrimas foram arrancadas. Neste momento podemos perceber que há uma guerra entre consciente e inconsciente. Orfeu exibe uma persona que agrada a todos, conseguindo até mesmo enganar a se mesmo, porém sua consciência visita o seu lado mais sombrio, o darkside, onde encontra suas inquietações referentes à Eurídice.
        Hades e Perséfone encantados com a música de Orfeu permitem-no que leve Eurídice de volta ao mundo dos vivos, mas, com uma condição: que Orfeu não olhasse para trás enquanto percorria o caminho de volta. Enquanto passavam em meio a trevas e uma névoa espessa a luz já se aproximava e ele já tomado de amores e esquecido da posição que lhe impuseram, Orfeu resolve olhar para Eurídice e nesse exato momento ouve-se um estrondo espantoso e ela diz: “Que loucura foi essa que perdeu a mim e a ti, Orfeu? Já de novo os destinos cruéis me chamam e o sono começa a serrar meus olhos. É hora de dizer-te adeus. A noite imensa me circunda e ergo em vão para ti as minhas mãos enfraquecidas”.
        Após Eurídice sumir como névoa, Orfeu se desespera por saber que sua música não poderia mais desdobrar os deuses infernais e que era impossível lutar contra suas leis. Por toda a vida, desse dia em diante, Orfeu cantou seu amor para Eurídice mergulhado em dor sabendo que perdera seu grande amor por um descuido fatal.
        Nessa ultima parte da história percebemos que Orfeu novamente trai Eurídice por olhar para trás, e por isso ela, sem suportar mais, some de vez da vida de seu grande amor. Afirma Eurídice “Que loucura foi essa que perdeu a mim e a ti, Orfeu?” logo afirma         “É hora de dizer-te adeus. A noite imensa me circunda e ergo em vão para ti as minhas mãos enfraquecidas”. Eurídice agora estava enfurecida e triste por mais uma vez Orfeu tê-la traído e assim, perdido os dois. E por ultimo afirma que já não tem forças o suficiente para tentar unir-se a Orfeu novamente, era o fim.
        O que podemos concluir é que, esse mito constitui um arquétipo típico de nossa época: o do homem ou mulher que afirma amar seu companheiro(a) porém sucessivamente o trai de alguma forma. Usam de uma persona encantadora e de um jeito de levar a situação a seu favor, mas que, em algum momento o companheiro(a) acaba que se cansando da situação e rompe de vez. E o companheiro traidor, em meio as suas dúvidas e guerras internas, tendem a sofrer sem nunca deixar de esquecer a tal pessoal que tanto amou.

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

A Garota que Corria no Vento


Para Andreza da Silva Sauro aquela que corre, corre, corre.



Era quase meia noite, eu esperava minha ultima garrafa de cerveja para encerrar a noite. Nada mais me interessava naquele lugar. Estava há dias enfadado de tanto modismo, de tanta linearidade nas pessoas, tanta gente igual, normal. Aquilo me enchia assim como a cerveja enchia minhas veias de álcool e cabeça de novas perspectivas. Agarrei o troco e a última cerveja e ao dar o primeiro gole me surge ao lado aquela pessoa inesperada olhando pra mim. Foi uma contradição espacial em relação ao que se passava naquele lugar, naquele momento. Todos tão cheios de si, tão presos a si, e do nada me aparece aquela figura desconcertando tudo ali, surpreendendo. Como se já não bastasse sua presença me fitando com olhos, ainda me pergunta.
- Vamos correr no vento?
- Como?
- É! Vamos correr no vento comigo?
- Como assim correr no vento?
- Correr, sentir, correr. Correr bem ali – Ela apontava para um vasto espaço aberto a nossa frente, como se fosse uma grande quadra aberta.
- Bom... É posso correr no vento com você – Nesse momento me perguntava como seria possível isso. Tinha ficado completamente desnorteado com a proposta – me deixa apenas terminar essa cerveja?
- Ah, deixa essa cerveja com alguém e vamos! Estou só, todos já foram e eu queria que alguém viesse junto comigo.
- Ok, tudo bem então – nesse momento fui a um amigo e o chamei também e logo depois deixei a garrafa de cerveja no chão sem pensar duas vezes.
Naquele momento já não podia entender nada. Lá estamos nós: Eu, ela e um amigo indo de encontro a um lugar totalmente vazio e aberto. E um pouco depois até começou a fazer sentido quando ela nos olhou.
- É preciso saber pra que lado o vento tá indo – e lá ia ela a nossa frente levantando um braço, sentindo o vento, se orientando. E lá fomos nós juntos ajuda-la nesse momento.
- Pronto! Acho que é por aqui. Vamos, vamos rápido!
Lá íamos nós seguindo o vento, indo na mesma direção e nesse momento ele começou a soprar mais forte e mais forte e em um piscar de olhos lá estávamos nós três correndo sentindo o vento bater em nossos rostos, balançando os cabelos. Comecei a me sentir melhor, livre até, e foi ai onde eu quis saber o porquê daquilo. Eu queria saber. Talvez ela corresse no vento com a intenção de se desligar, de se partir em mil pedaços, se espalhar no ar. Talvez ela corresse pra deixar tudo pra trás e o vento levasse. Não, eu não entendia, mas quis saber.
Depois paramos de correr, estávamos um pouco cansados, puxando ar, meio sem fôlego e do anda ela nos chama a atenção.
- Novamente, novamente! – saiu correndo sem nos esperar e logo fomos atrás e novamente lá estávamos nos indo até a outra extremidade de onde tínhamos partido. Naquele momento eu já não me segurava.
- Porque você faz isso? – Gritei.
- Eu não sei, ou talvez eu saiba, mas não sei dizer – nesse momento ela parou e veio mais pra perto.
- Você sabe quando nós sentimos que nossa barriga está ali? Você sabe que ela está ali?
- Não sei, eu acho – respondi.
- A gente sabe que ela está ali quando estamos com fome. E o que fazemos pra parar? Comemos! A gente sabe que ela está quando estamos com dor de barriga. E o que fazemos pra parar? Vamos ao banheiro ou tomamos algum remédio. A gente sabe quando tá com “borboletas no estômago”. E o que fazemos? Tentamos relaxar. É assim que a gente sente nossa barriga, mas não me pergunte sobre correr no vento. Às vezes só quero correr.
- Mas talvez você tenha alguma razão. A gente sempre tem alguma razão pra fazer as coisas. Talvez queira se livrar de algo?
- Não sei, talvez. Corro pra me sentir bem. Corro porque me sinto livre. Talvez um dia ele me leve pra algum lugar. Tenho algumas certezas e como trata-las, como as da barriga, mas correr ainda é incógnita. Quem sabe seja melhor assim. Quem sabe quando eu descobrir ele possa me levar pra onde eu quiser ou para onde ele for. Por enquanto prefiro correr e me sentir nele, me sentir ele, sem limites. Talvez seja um começo de resposta isso. Sem limites.