É de se lamentar ou comemorar o fato de sabermos
tanto do que nos rodeia e negarmos reconhecer aquilo que em nós já não existe,
ou talvez, há muito tempo deixou de existir. Trata-se de recompor a genealogia
do eu no que ela tem de negativo, de mal entendido, de não aceito. Das
categorias vivas e semelhantes estamos tão distantes. Somos sós, desde o berço,
no desamparo dos símbolos, esses, loucos torturadores de nossa pueril
existência. É hora de se deixar passar ao longe a ideia de uma natureza para homens,
a fauna e flora agradeceriam tamanho favor! É hora de pensar na propaganda
diária, as categorias egoístas de todos os dias, a força impulsionadora do
poder, o outro sempre imperante, a frase, a palavra que nos escapa, o tropeço.
Das formas ludibriadas dos séculos passados, tenhamos repulsa! Elas criaram
monstros, anormais, maldições. Deixemos de lado a essência, o instinto. De nada
valem! Delírios de uma época apegada aos alicerces perversos de ideias de quem
o privilégio de já não se sentir animal beirava a sua mesa de jantar. É do não
animal, do não instintual, da não essência o que falo. O fato da comparação, da
internalização, o fato de sentir pertencente de tais aspectos nega a própria
existência daquilo que só pode existir longe do romantismo, dessa amaldiçoada
ligação cosmológica, natural, aos outros seres. Desacreditar do natural do
homem é romper fronteiras. De todo o mal que pode haver na descrença do que é
confortável a nós, teremos a alvorada e das cinzas uma nova forma de ver o cão
que corre atrás do pneu de um automóvel, da criança que chora, do jovem que
mata, do idoso e suas plantas, uma nova forma de ver que tudo, antes de nós,
nunca existiu.
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